Entre os desafios da modernidade e a resposta ao cidadão

Desjudicialização da Justiça

Desjudicialização é o movimento que tende a subtrair à atividade dos tribunais áreas de decisão que tradicionalmente lhes pertenciam, deslocando-as para outros serviços públicos ou para entidades privadas. Este movimento surge como resposta à crítica que se fez sentir em Portugal e noutros países como a Itália, França ou Espanha, em que os tribunais foram severamente criticados pela sua ineficiência, inacessibilidade, morosidade, custos, falta de transparência, muito decorrente da elevada procura por parte de empresas e cidadãos, particularmente em determinadas áreas como os conflitos familiares ou laborais.

Para evitar a rutura dos sistemas judiciais, os diversos governos promoveram reformas, onde se insere um conjunto de práticas e de processos, mais ou menos informais, de resolução de conflitos, privilegiando os meios de negociação e consenso e fazendo apelo à participação ativa das partes e dos cidadãos. Ou seja, o desenvolvimento de meios alternativos de resolução de litígios, através do incentivo à realização de acordos extrajudiciais, ou processos mais institucionalizados, que levam a um desvio da procura dos tribunais para outras instâncias, públicas ou privadas.

A Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, vem regular a organização, competência e funcionamento dos Julgados de Paz. Constitui-se uma rede de tribunais de proximidade, instalados e funcionando em cooperação com os Municípios e vocacionados para a participação dos cidadãos. Os julgados de paz estão concebidos e são orientados por princípios de simplicidade, adequação, informalidade, oralidade e absoluta economia processual e as matérias pelas quais são competentes para apreciar e decidir constam do artigo 9.º da referida lei, onde se incluem, por exemplo, ações para cumprimento de obrigações , ações de entrega de coisas móveis, ações resultantes de direitos e deveres de condóminos, bem como apreciação de pedidos de indemnização cível emergentes de ofensas corporais simples, de ofensa à integridade física por negligência, de difamação, por injúrias, furto simples e dano simples, quando não haja sido apresentada participação criminal.

É neste contexto de desjudicialização que se insere a Lei n.º 82/2001, de 3 de agosto, que autoriza o Governo a atribuir e transferir competências relativamente a um conjunto de processos especiais dos tribunais judiciais para o Ministério Público, as conservatórias de registo civil, predial, comercial e automóvel e os cartórios notariais.

Pelo Decreto-Lei n.º 272/2001, de 13 de outubro – que, ao abrigo da referida Lei n.º 82/2001, de 3 de agosto, opera a transferência de competência decisória em determinados processos de jurisdição voluntária dos tribunais judiciais para o Ministério Público e as conservatórias do Registo Civil – refere-se o propósito de desonerar os tribunais de processos que não consubstanciem verdadeiros litígios, permitindo uma concentração de esforços naqueles que correspondem efetivamente a uma reserva de intervenção judicial.

Privilegia-se, ainda, o acordo como forma de solução e salvaguarda-se, simultaneamente, o acesso à via judicial nos casos em que não seja possível obter uma composição pelas próprias partes. Também sofre alterações a tutela dos interesses dos incapazes ou ausentes, que passa do tribunal para o Ministério Público.

Ao abrigo do mesmo Decreto-Lei n.º 272/2001, de 13 de outubro, passam a constar como competência dos Instituto dos Registos e do Notariado, decididos pelo conservador de registo civil, a atribuição de alimentos a filhos maiores ou emancipados, a atribuição da casa de morada de família, a autorização ou a privação do direito de uso dos apelidos do ex-cônjuge, desde que não sendo situações de pedidos cumulados com outros pedidos no âmbito de uma mesma ação judicial, bem como a conversão da separação judicial de pessoas e bens em divórcio, o procedimento de reconciliação extrajudicial de cônjuges separados, ou a separação de pessoas e bens e o divórcio por mútuo consentimento em processo extrajudicial.

Julgados de Paz

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