Monarquia Constitucional
Da revolução liberal à guerra civil
Ministério / Secretaria de Estado
dos Negócios Eclesiásticos e de Justiça
Secretaria de Estado
dos Negócios da Justiça
Integração da Secretaria de Estado
dos Negócios da Justiça na SE dos Negócios do Reino (Extinção)
Secretaria de Estado
dos Negócios Eclesiásticos e de Justiça
Revolução Liberal
Abrilada
Vilafrancada
Guerra Civil
1852
1º Código Penal
1849
Regresso de Costa Cabral
1876
1º Código de Processo Civil
1867
1º Código Civil
1890
Ultimato inglês
1895
1º Código
de Processo
Comercial
1895
Inauguração
Colónia Correcional
de Vila Fernando
1841
Novíssima Reforma
Judiciária
1867
Abolição da pena de morte
1868
Regulamento
do Registo Predial
Monarquia Constitucional
A Revolução Liberal de 1820 (24 de agosto de 1820)
Movimento associado ao pensamento iluminista da época das Luzes, espoletado pela propagação na Europa da ideologia revolucionária francesa e sobretudo pelas consequências das Invasões Francesas (1807-1810), da ausência da família real, da perda progressiva do Brasil e pelos resultados das guerras peninsulares que reafirmaram o poderio inglês, bem como pela débil estrutura económica. Em janeiro de 1818, no Porto, é fundado o Sinédrio, uma organização secreta que difunde estes ideais. A Revolução tem início com a proclamação da extinção do regime absolutista, no Porto, a 24 de agosto de 1820, pela guarnição militar da cidade. Vem a ser instituída uma Junta Provisional do Governo Supremo do Reino, com funções administrativas, e uma Junta Provisional Preparatória das Cortes, enquanto se aguarda o regresso de D. João VI e se prepara a Constituição.Preconizava-se o princípio da divisão tripartida dos poderes, em que o poder judicial deveria ser independente e o poder executivo assistido por um Conselho de Estado. Com a aprovação da Constituição, Portugal inicia o período denominado de Monarquia Constitucional.
Secretaria de Estado dos Negócios de Justiça
A Secretaria de Estado dos Negócios de Justiça é consequência da Revolução Liberal de 1820 que preconizava uma nova função para o Estado e, por conseguinte, para a organização administrativa que o suportava. Desde o primeiro momento, esta Secretaria de Estado encontra-se prevista no projeto de Constituição Liberal, conforme apresentado por José Moura – em nome da Comissão da Constituição -, na Sessão das Cortes Constituintes de 8 de fevereiro de 1821. O novo modelo de governo, previsto na Constituição de 1822, integra seis Secretários de Estado: o dos Negócios do Reino, o da Justiça, o da Fazenda, o da Guerra, o da Marinha e o dos Estrangeiros, que assistiam o Rei. Ainda antes do juramento da Constituição, D. João VI, regressado do Brasil, no Palácio de Queluz, por Lei de 23 de agosto de 1821, cria a Secretaria de Estado dos Negócios de Justiça, à qual compete “todos os objetos da Justiça Civil e Criminal, todos os negócios eclesiásticos, a expedição das nomeações de todos os lugares de magistrados…, a inspeção das prisões e quanto é relativo a Segurança Pública”.
1º Regulamento Interior
A 27 de agosto de 1822, José da Silva Carvalho – fundador do Sinédrio e membro da Junta Provisional do Governo Supremo do Reino, nomeado Ministro e Secretário de Estado dos Negócios de Justiça – provê a Secretaria de Estado dos Negócios de Justiça de um regulamento interior que estabelece três secções: a 1ª secção para as relações com o Desembargo do Paço, os Tribunais do Reino e Casas da Relação; a 2ª secção para a Segurança Pública e a 3ª Secção para os Negócios Eclesiásticos.
Constituição de 1822 aprovada em 23 de setembro de 1822
A inclusão dos direitos humanos constitui um dos traços distintivos face a outras constituições europeias anteriores, que não os incluem ou fazem-no de forma dispersa.
Assim no seu artigo 1.º estatui que a“…Constituição política da Nação Portuguesa tem por objeto manter a liberdade, segurança, e propriedade de todos os Portugueses”. E no artigo 2.º dispõe que a “… liberdade consiste em não serem obrigados a fazer o que a lei não manda, nem a deixar de fazer o que ela não proíbe. A conservação desta liberdade depende da exata observância das leis”.
A lei assume um papel primordial e subsidia a criação de uma Secretaria de Estado para os Negócios de Justiça.
Vigorou menos de um ano, entre 23 de setembro de 1822 e 3 de junho de 1823 e, mais tarde, entre 1836 e 1838.
Foi substituída pela Carta Constitucional portuguesa de 1826.
Vilafrancada (27 de maio de 1823)
Esta insurreição culmina a 27 de maio de 1823, quando o Infante D. Miguel se dirige a Vila Franca e a ele se junta um regimento de infantaria para proclamação da monarquia absoluta. No final do mês, D. João VI decide tomar a direção da revolta, e obriga o infante rebelde a submeter-se-lhe.
Regressa triunfalmente a Lisboa e promete modificar a Constituição de 1822, que viria a ser anulada por Decreto de 18 de junho de 1823
Extinção da Secretaria de Estado dos Negócio de Justiça
No rescaldo da reação absolutista da Vilafrancada, D. João VI já no Palácio da Bemposta, com o Conde de Subserra como ministro assistente ao despacho, por Alvará com força de Lei de 19 de março de 1824, revoga a Carta de Lei de 1823 e integra na Secretaria de Estado do Reino a Secretaria de Estado dos Negócio de Justiça, extinguindo-a.
Abrilada (30 de abril de 1824)
No dia 30 de abril de 1824, o Infante D. Miguel, que havia sido nomeado generalíssimo do Exército Português, empreende uma nova insurreição absolutista. Em maio, D. João VI refugia-se no navio britânico “HMS Windsor Castle”, de onde toma uma série de medidas: demitiu D. Miguel do seu cargo no Exército, ordenou a libertação dos presos políticos e a captura dos apoiantes do filho, que viria a ser deportado para Viena.
Recriada a Secretaria de Estado dos Negócio de Justiça
Logo em maio, no novo contexto decorrente da reação a mais uma revolta absolutista (a Abrilada), D. João VI, a bordo da nau inglesa onde se refugiara, recria por Alvará com força de Lei de 12 de maio de 1824, a Secretaria de Estado dos Negócios de Justiça, retirando-a da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino e atribuindo-lhe uma nova denominação, que acrescenta o termo “Eclesiásticos”.
A Carta Constitucional
A Carta Constitucional de 1826 representou um compromisso entre os defensores da soberania nacional adotada na Constituição de 1822 e os defensores da reafirmação do poder régio. Estipulava um sistema monárquico em que cabia ao rei a responsabilidade última do poder executivo e uma função de moderação na sociedade; definia os princípios gerais de administração do reino, prevendo a separação dos poderes (legislativo, moderador, executivo e judicial); e garantia os direitos dos cidadãos, no tocante à liberdade, à segurança individual e à propriedade. A Carta vigorou durante três períodos:
1. Entre julho de 1826 e maio de 1828, data em que D. Miguel convocou os três Estados do Reino, que o aclamaram rei e decretaram nula a Carta Constitucional;
2. A partir de agosto de 1834, com a vitória do Partido Liberal na Guerra Civil e a saída do país de D. Miguel, terminando com a revolução de setembro de 1836;
3. Após janeiro de 1842, com o golpe de Estado de Costa Cabral, até 1910.
A Guerra Civil (1832-1834)
Guerra fratricida entre liberais (liderados por D. Pedro) e absolutistas (liderados por D. Miguel).
O Registo Civil
Mouzinho da Silveira, em plena guerra liberal, durante o governo da Regência do Reino estabelecida na Ilha Terceira, define a organização administrava e judicial do território. Logo no Decreto de 16 de maio de 1832 é efetuada a primeira menção ao registo civil, marca do liberalismo, em oposição ao controlo e registo dos cidadãos efetuado nas paróquias. Ao Provedor do Concelho, figura criada pelo Decreto nº 23, de 16 de maio de 1832, é atribuída a competência do registo civil da população.
O exercício desta competência, com o Decreto de 18 de julho de 1835, referendado pelo Ministro Rodrigo da Fonseca Magalhães, viria a passar para o, então criado Administrador do Concelho – funcionário escolhido pelo Governo, sobre lista feita por eleição direta e pela mesma forma das eleições das Câmaras Municipais – que fica responsável pela “redação e guarda do registo civil, pela qual a autoridade pública atesta e legitima as épocas principais da vida civil dos indivíduos, a saber: o nascimento, casamento e óbito.”
Todavia, reservava para regulamento especial a execução deste preceito.
O Código Administrativo de 1836, referendado por Passos Manuel, estatui que o registo civil continuasse a ser feito pelos párocos enquanto o governo não publicasse os modelos para o mesmo registo e não determinasse quando deveria passar para as autoridades administrativas.
O Código Administrativo de 1842 estabelece novamente o registo civil, mas também o deixa dependente de regulamento.
Verificaram-se, assim, grandes dificuldades para levar a cabo esta secularização do registo e pelo Decreto de 19 de agosto de 1859, o Estado reconhece a vantagem da manutenção do registo paroquial. No diploma, apesar de se assumir que faltavam formulários nas dioceses, que falhavam declarações e dados indispensáveis para os registos, que não havia fiscalização e que a sua conservação era inadequada, o Estado limita-se a tentar eliminar as principais deficiências deste registo e a subordinar a sua realização a princípios jurídicos uniformes, que assegurassem a sua regularidade e fiscalização, tentando reger o “registro parochial em harmonia com as prescrições da Lei civil”. Assim, o registo civil passa a ser obrigatório, mas continua a ser efetuado pelo pároco da paróquia em livro numerado pelo “Provisor ou Vigário Geral”.
Mas só em 1878 existirão novidades. O Governo cria uma Direção-Geral de Registo Civil e Estatística, na dependência da Secretaria de Estado dos Negócios Eclesiásticos e de Justiça, com uma repartição com funções relativas à de organização e serviço do registo civil e à inspeção do registo civil e do eclesiástico.
A Reforma Judicial
A primeira reforma judicial é apresentada por Mouzinho da Silveira, Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Eclesiásticos e de Justiça, através do Decreto de 16 de maio de 1832. O relatório que o acompanha realça os quatro princípios orientadores da reforma: a) separação de poderes; b) eficiência da justiça; c) obrigatoriedade da participação popular na administração da justiça; d) prevalência da conciliação na resolução dos litígios. Territorialmente, o país é dividido em círculos judiciais e estes em comarcas que, por sua vez, se subdividiam em julgados e os julgados em freguesias.
Na década de 30 verifica-se nova reforma, agora em dois momentos: o primeiro, por Decreto de 29 de novembro de 1836, relativo “à divisão judicial do território e à organização do pessoal para a administração da justiça”, divide o território em comarcas, estas em julgados e estes em freguesias, mantém as alterações de 1835 com a concentração da segunda instância nos distritos das Relações de Lisboa e do Porto e de Ponta Delgada para as ilhas adjacentes; o segundo momento, por Decreto de 13 de janeiro de 1837, estabelece as regras de processo civil e criminal. O relatório do decreto de 1836 enuncia os três objetivos da reforma: a) proximidade da justiça aos cidadãos; b) celeridade na resolução das causas; c) e clareza da ordem jurídica.
Os primeiros códigos legislativos
Com a instauração da monarquia constitucional, cedo se constatou a necessidade de reunir numa única lei todas as disposições sobre uma determinada matéria, ou seja, um código, que estabelecesse claramente as ordenações do novo regime em oposição ao antigo regime. Sucessivamente vão sendo publicados os primeiros códigos desta nova era. Ainda nos Açores, em 1832, Mouzinho da Silveira, à data Ministro e Secretário de Estado dos Negócios de Justiça, apresenta a primeira reforma administrativa do liberalismo, que viria a ser aprovada pelo Decreto n.º 23, de 16 de maio de 1832. Não era ainda um verdadeiro código administrativo, mas estabelece as bases para as publicações futuras.
O primeiro código a ser sancionado pelo Rei, após aprovação das Cortes, é o Código Comercial (1833). Será também o primeiro código a ser revisto. Na área da Justiça são ainda publicados o Código Penal (1852), o Código Civil (1867) e o Código de Processo Civil (1876), o Código de Processo Comercial (1895) e o Código das Falências (1899). Estes códigos têm maioritariamente como característica a sua longevidade, tendo-se alguns mantido em vigor por quase um século. Complementarmente, é publicada legislação que, não originando um código, é da maior importância, como a reforma penal de 1867, que aboliu a pena de morte por crimes civis, ou o conjunto de diplomas relativos ao registo predial. Para a área da Justiça, nomeadamente o registo civil, são ainda relevantes as disposições do Código Administrativo (1836, 1842, 1870, 1878, 1886, 1895). Neste caminho destacam-se três ministros: António Seabra, Barjona de Freitas e Veiga Beirão.
A primeira organização da Secretaria de Estado
Em 1832, em plena guerra civil entre liberais e absolutistas, seis meses após o desembarque no Mindelo, D. Pedro, no Paço do Porto, por Decreto de 2 de dezembro de 1832, por iniciativa de Mouzinho da Silveira, confere uma orgânica formal à Secretaria de Estado dos Negócios Eclesiásticos e de Justiça, dividindo-a em três repartições, com os chefes de Repartição subordinados a um diretor-geral:
– De Negócios Eclesiásticos
– De Justiça
– De Segurança Pública
Significativamente, a Segurança Pública é reintegrada na Justiça, após a sua separação decretada durante a insurreição da Vilafrancada.
Código Comercial
Aprovado por D. Pedro IV, pelo Decreto de 18 de setembro de 1833, é o primeiro código a ser redigido em Portugal. José Ferreira Borges, político, economista e jurista português, elaborou este projeto de código, que foi assinado pelo Ministro da Justiça José da Silva Carvalho. O Código tinha por finalidade regular os atos do comércio e facilitar a prática do princípio da liberdade comercial, determinando os direitos e obrigações dos comerciantes. Conforme o espírito da época, aplicava-se aos negociantes de comissão e mercadores de grosso e retalho, aos banqueiros, aos fiadores e aos fabricantes ou gerentes de fábricas. Marca uma rutura com as disposições que se encontravam dispersas pelas instituições do anterior regime, nomeadamente o “Tribunal da Junta do Comercio, Agricultura, Fabricas, e Navegação, do Conselho do Almirantado, do Juízo de India e Mina, e dos Ouvidorias da Alfandega”.
O início da vigência do Código data de 14 de janeiro de 1834 e, por Portaria de 24 de janeiro de 1834, viria a ser estabelecido em Lisboa o Tribunal Comercial de 1ª e 2ª instâncias, para serem regularizados os processos segundo o Decreto de 1833.
Código Administrativo
O Código Administrativo, da competência do Ministério do Interior, reveste-se de primordial importância para a Justiça, na medida em que estabelece a organização administrativa do reino. Assim, o primeiro Código Administrativo é aprovado em 31 de dezembro de 1836. Inspirado nas reformas iniciais de Mouzinho da Silveira divide o território em Províncias, Comarcas e Concelhos. A Província era administrada por um Prefeito, a Comarca por um Sub Prefeito e o Concelho por um Provedor (cargos desempenhados por magistrados). O Concelho tinha várias freguesias e as Juntas de Paróquia foram extintas. No que diz respeito à função registral da Justiça, estabelece que o Provedor Administrativo do Concelho efetua o registo civil da população. Este será o código objeto de maior número de revisões: 1842,1870, 1878, 1886 e novamente em 1895.
O Cabralismo
Termo porque ficou conhecido o período em que Costa Cabral controlou a política em Portugal. A forma de poder é marcada pelo restabelecimento da Carta Constitucional de 1826, que Costa Cabral mandou seguir escrupulosamente. É derrubado em 1846, por Maria da Fonte e banido em 1847, na sequência da guerra civil da Patuleia. Regressa ao poder em junho de 1849, com a anuência tácita do exército e o apoio expressivo da Rainha.
Reestruturação de 1849
Costa Cabral, num novo fôlego como chefe do governo, promove uma série de reestruturações, entre as quais a reorganização da Secretaria de Estado dos Negócios Eclesiásticos e de Justiça (SENEJ). Assim, por Decreto de 8 de novembro de 1849, sob um exaustivo e explicativo regulamento do Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Eclesiásticos e de Justiça, Félix Pereira de Magalhães, a SENEJ passa a dividir-se em quatro Repartições. São criadas duas unidades orgânicas exclusivamente para apoio: a Repartição Central e a Repartição de Contabilidade; mantêm-se a Repartição dos Negócios Eclesiásticos e a Repartição dos Negócios de Justiça.
Código Penal
O Decreto de 10 de dezembro de 1852, do Ministro Rodrigo da Fonseca Magalhães, substituiu a antiga legislação criminal e reuniu num único código todas as disposições da área criminal. O Código encontrava-se dividido em duas partes: a primeira parte relativa às regras gerais, que dominam todas as matérias do Código; a segunda parte relativa à parte criminal mais específica, referente a acusações, punições e penas correspondentes. Neste âmbito, são ainda de realçar alguns diplomas que, não tendo a forma de códigos, influenciam esta matéria e são cruciais para a Justiça. Destaca-se a Lei aprovada a 1 de julho de 1867, que unifica a legislação penal, a chamada Reforma Penal de Barjona de Freitas que, entre outras inovações, aboliu a pena de morte por crimes comuns.
Em 1884 Sampaio e Melo propôs uma nova reforma penal às Cortes que revia substancialmente as disposições do Código Penal de 1852 e que ficou conhecida como Reforma Penal de Sampaio e Melo. Esta reforma aboliu todas as penas de prisão perpétua, de expulsão definitiva do Reino, de trabalhos públicos e de perda de direitos políticos e de exílio.
O Decreto de 16 de setembro de 1886, assinado por Francisco António da Veiga Beirão, veio reformular o Código Penal de 1852. Foi um dos códigos que em Portugal esteve durante mais tempo em vigor, só sendo substituído pelo Código Penal de 1982, apesar da multiplicidade de diplomas avulsos entretanto publicados.
Bipartidarismo
A primeira fase do constitucionalismo monárquico é dominada pela instabilidade político-social. Neste período constituíram-se apenas dois grandes partidos: o Partido Progressista Histórico e o Partido Regenerador, que asseguraram rotativamente o poder, numa aparente polarização desenvolvida sobretudo depois de 1856. Para a designação como chefe do governo prevalece a relação de proximidade que o titular tem com a Casa Real. Destacam-se o Marquês de Sá da Bandeira e o Duque de Loulé na década de 1860 e António José de Ávila e Fontes Pereira de Melo, na de 1870.
O sistema bipartidário é alterado substancialmente, a partir da década de 90, pelas crises e cisões nestes dois grandes partidos, na sequência do Ultimato britânico de 1890, segundo o qual Portugal era obrigado a renunciar a parte do seu território africano. Inicia-se uma segunda época do rotativismo em fevereiro de 1893, arrastando-se até maio de 1906, quando este ciclo é interrompido por D. Carlos com a nomeação de João Franco para liderar o executivo.
Reestruturação de 1859
Esta reestruturação veiculada pelo Decreto de 19 de agosto de 1859, apresentada por João Martens Ferrão – convidado a integrar o governo regenerador-cartista de António José de Sousa Manuel de Menezes Severim de Noronha, o 1.º duque da Terceira, como titular do Ministério da Justiça e Negócios Eclesiásticos -, insere-se na reorganização dos serviços centrais das Repartições do Estado, resultante da necessidade de melhoria dos diversos ramos da Administração Pública.
A Reforma Penal
A carta de Lei pela qual D. Luís sanciona o Decreto das Cortes Gerais de 26 de junho de 1867, que aprova a reforma penal e das prisões, substitui a moldura penal remanescente do antigo regime – penas de morte, trabalhos públicos perpétuos ou temporários, e prisão maior perpétua – e institui um novo sistema de penas de prisão maior em regime celular contínuo, com absoluta e completa separação, de dia e de noite, entre os condenados, sem qualquer comunicação entre eles. Tal sistema implicou a adoção de novas estruturas, as cadeias penitenciárias, bem distintas das enxovias, calabouços ou masmorras, onde até então eram cumpridas, sem condições físicas ou morais, as condenações. Todavia, a total ausência de contacto acarretou o uso de um capuz que cobrisse o rosto do prisioneiro quando este saísse da cela.
Código Civil
O primeiro Código Civil em Portugal, redigido por António Luís de Seabra e Sousa, foi aprovado por Carta de Lei de 1 de julho de 1867, com Barjona de Freitas como Ministro da Justiça. Reúne e atualiza toda a legislação civil. Tendo em vista a revisão e melhoria deste Código, é formada uma comissão de juristas para receber contributos dos tribunais e de outros jurisconsultos, durante cinco anos, e apresentar ao governo propostas de alteração. Este Código apenas será revogado pelo Código Civil de 1966, que entrou em vigor em 1967, e manteve-se em aplicação em Goa até finais da década de 1990.
A abolição da Pena de Morte
A pena de morte foi abolida em Portugal para todos os crimes em 1867 (Lei de julho de 1867), exceto os crimes por traição durante a guerra. A proposta partiu do Ministro da Justiça, Augusto César Barjona de Freitas, à Câmara dos Pares. A proposta foi aprovada, mas só 3 anos depois seria abolida nos crimes civis nas províncias ultramarinas (9 de junho de 1870).
Regulamento do Registo Predial
O denominado “registo hipotecário”, criado pelo Decreto de 26 de outubro de 1836, que estabelece a obrigatoriedade do registo de hipoteca e outros factos, estará na origem do registo predial. Com a publicação da primeira Lei Hipotecária, em 1 de julho de 1863, alarga-se o âmbito do registo ao domínio da propriedade, aos ónus reais e às ações. Consagra-se o princípio da publicidade, ao determinar que, se não for efetuado o registo do direito, não se pode fazer valer esse direito contra outro que tivesse efetuado o registo, mesmo sendo posterior. O Código Civil de 1867 viria a determinar as normas definitivas sobre o registo, cuja última forma foi dada pelo Regulamento do Registo Predial de 14 de maio de 1868, já com António Luís de Seabra e Sousa na pasta da Justiça. O Regulamento estabelece que continua a haver conservatórias em cada concelho, enquanto se não puderem instituir conservatórias privativas, segundo a circunscrição territorial mais conveniente. Estabelece ainda que continua a haver um conservador privativo em cada um dos distritos criminais em que se dividem as comarcas judiciais de Lisboa e Porto.
O Regulamento de Registo Predial de 28 de abril de 1870 veio organizar as conservatórias privativas e as funções dos conservadores. Pelo Regulamento de 20 de janeiro de 1898 regulam-se e simplificam-se as operações de registo.
Reestruturação de 1869
Em 1869, Luciano de Castro, chamado a integrar o terceiro governo do Duque de Loulé (Partido Histórico) como Ministro da Justiça, procede a uma nova reorganização da Secretaria de Estado dos Negócios Eclesiásticos e de Justiça, com o objetivo de reduzir a despesa pública. A Direção Central e a Repartição de Contabilidade são extintas e é criada uma Repartição Central que as agrega. Mantêm-se o Gabinete do Ministro e as duas Direções-Gerais (dos Negócios Eclesiásticos e dos Negócios de Justiça). Os Diretores-Gerais, bacharéis, são escolhidos pelo Ministro e o cargo de Secretário-Geral é exercido pelo Diretor-Geral mais antigo.
Código de Processo Civil
O Código de Processo Civil, apresentado por Barjona de Freitas, foi aprovado em 8 de novembro de 1876, por Carta de Lei, dada no Paço da Ajuda, que sanciona o decreto das cortes gerais de 1 de abril de 1876. Revoga toda a legislação anterior sobre o processo civil. Este código, apenas será substituído com a aprovação do Código de Processo Civil de 1939.
Reestruturação de 1878
Em 1878, Barjona de Freitas, ministro do novo governo de Fontes Pereira de Melo (Partido Regenerador), por Decreto de 19 de setembro, procede a mais uma reforma administrativa no Ministério dos Negócios Eclesiásticos e de Justiça. A grande novidade desta reestruturação é a criação da Direção-Geral do Registo Civil e Estatística, dando corpo e autonomia a um desiderato da reforma de Mouzinho da Silveira de 1832.
A Direção-Geral do Registo Civil, há muito reivindicada pelas instâncias do espírito liberal, tinha como competências a organização do registo civil e a inspeção deste registo e do eclesiástico. Todavia, não se assume um registo integralmente civil, o registo eclesiástico continua a ser uma realidade, assumida no próprio diploma. Neste diploma, proclamam-se igualmente as vantagens da estatística como fornecedora de elementos para o estudo e resolução dos problemas da administração, da economia e da política.
Primeiras preocupações com a delinquência juvenil
A resposta inicial à necessidade de institucionalização de menores para aplicação de medidas corretivas veio a materializar-se na criação, em 15 de junho de 1871, da primeira Casa de Detenção e Correção de Lisboa para menores do sexo masculino, que entraria em funcionamento em 20 de outubro de 1872. Todavia, o ambiente severamente repressivo, aliado à diminuta duração das penas dos menores, não eram propícios à colocação em prática da missão educadora e reformadora a que estas instituições estavam destinadas. No sentido de suprir esta carência, em 1878, foi apresentado um projeto de criação de mais duas casas de detenção e correção e a fundação de uma Colónia Agrícola. Esta ideia só viria a concretizar-se pela Lei de 22 de junho de 1880, que autorizou a criação da Escola Agrícola de Vila Fernando.
É uma primeira tentativa de passagem da criminalização da miséria para um contexto de uma política social, em que o Estado aparece como promotor da proteção aos menores desvalidos e delinquentes. Contudo, o avultado número de internados que povoam estas instituições e as que sucessivamente vão sendo criadas, às equipas de profissionais com pouca competência em matéria de reeducação, rapidamente dão lugar a uma disciplina severa, que em nada contribui para a mudança dos menores e a transformação moral pretendida.
Reestruturação de 1892
Passado o período conturbado do Ultimato Inglês, António Teles Pereira de Vasconcelos Pimentel apresenta nova reestruturação. Mantém-se o Gabinete do Ministro, com um conselho consultivo na sua dependência, composto do secretário-geral, diretores e chefes de repartição. As duas direções-gerais (dos Negócios Eclesiásticos e dos Negócios de Justiça) passam a direções, e a Repartição Central passa a Direção Central, com duas repartições. As funções de registo civil e estatística, atribuídas pelo Decreto de 19 de setembro de 1878 à Direção-Geral de Registo Civil e Estatística, passam para a 2ª Repartição da Direção Central. É ainda referido que a 4.ª repartição da Direção-Geral da Contabilidade Pública funciona junto da Secretaria de Estado, nos termos da lei vigente. O cargo de Secretário-Geral é exercido pelo diretor-geral responsável pela Direção Central.
Código de Processo Comercial
Veiga Beirão, Ministro da Justiça, logo em 1888, nomeia uma comissão de jurisconsultos e comerciantes para a elaboração de um código do processo comercial organizado em corpo distinto do Código Comercial. Como o relatório que acompanha o Código começa por referenciar, “… A reforma do processo comercial, que era necessária depois da do processo civil, tornou-se em verdade indispensável desde a publicação do (…) código comercial”.
Esta comissão apresentará um projeto, examinado e discutido em Conselho de Ministros e aprovado por decreto de 24 de janeiro de 1895.
O Código de 1895 fixa a forma como os tribunais do comércio devem conhecer as causas da sua competência. Estabelece, ao lado do processo mercantil ordinário, processos especiais quando os casos pareçam tornar necessária uma pronta ação judicial, classificados em quatro secções (emergentes do comércio geral, dos contratos especiais de comércio, do comércio marítimo ou de falências).
Código das Falências
O Decreto de 26 de julho de 1899, assinado pelo Ministro José Maria de Alpoim Cerqueira Borges Cabral, aprova o primeiro Código das Falências. As falências faziam parte de uma secção do Código Comercial, mas, com o objetivo de reorganizar e aperfeiçoar esta área legislativa em conformidade com o pensamento comercial da época, foi retirada para Código específico.
Este Código vigorará até 1935 e em 1939 as suas disposições, tal como as do Código de Processo Comercial, viriam a ser integradas no Código de Processo Civil (Decreto-Lei nº 29.637, de 28 de maio).
O surgimento dos Serviços Médico-Legais
A Carta de Lei de 17 de agosto de 1899 cria os Serviços Médico-Legais em Portugal. O país é dividido em três circunscrições (Lisboa, Porto e Coimbra), onde deveriam ser criadas morgues com funções não apenas periciais, mas também de ensino prático da medicina legal. Cria também o lugar de médico antropologista criminal nas cadeias civis de Lisboa e Porto. A Lei estabelece, ainda, o funcionamento de um Conselho Médico-Legal em cada uma destas circunscrições.
Reestruturação de 1901
Reinstalado o bipartidarismo, Campos Henriques, ministro do governo chefiado por Ernesto Hintze Ribeiro (Partido Regenerador) promove a última reestruturação orgânica do período monárquico.
É criado o Conselho Superior Judiciário na dependência direta do Gabinete do Ministro. Este conselho é composto pelo Ministro da Justiça como presidente, por um juiz conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, o vice-presidente, dois juízes da Relação de Lisboa, um juiz de direito da 1ª instância da Comarca de Lisboa e um ajudante do Procurador Geral da Coroa e Fazenda. O conselho tinha por objetivo propor reformas ao Governo em relação aos assuntos judiciais do Ministério Público e aos funcionários da justiça consultar as propostas de lei que o Governo pretende apresentar às Cortes ou sobre outro Regulamento; sobre “todos os mais negocios que forem submettidos ao seu exame por quaesquer disposições legislativas ou regulamentares”; “emittir parecer sobre todos os assumptos de administração de justiça em que for consultado pelo Governo”.